Os contratos celebrados por mutuário para aquisição da casa própria, no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação – SFH, segundo a legislação específica, são contratos de natureza personalíssima, isto é, somente vinculam e devem ser executados entre o adquirente ou promissário comprador e a instituição financeira que concedeu o crédito, sendo que o credor passa a ser titular de um direito real sobre o imóvel, através da constituição de hipoteca, que somente é liberada após a integral quitação do preço. Essas as condições jurídicas básicas em que esse negócio imobiliário é formalizado.
Todavia, incorporou-se ao costume imobiliário no Brasil, com o decorrer dos anos, uma figura atípica, denominada de “contrato de gaveta”, que é uma operação pela qual o mutuário originário transfere a outra pessoa, mediante contrato não registrado em cartório de imóveis e sem o consentimento do credor hipotecário, a posse do imóvel adquirido através do SFH. A própria jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, diante da multiplicação de negócios desse tipo, chegou a elaborar uma definição para os contratos de gaveta, considerados como “designação atribuída aos negócios jurídicos de promessa de compra e venda de imóvel realizados sem o consentimento da instituição de crédito que financiou a aquisição” (STJ, 3ª Turma, RESP 119.466-MG, Relator Min. Ari Pargandler, DJU 19.06.2000).
Cabe ressaltar que a legislação do SFH sempre admitiu a transferência ou cessão dos direitos e obrigações dos contratos de promessa de compra e venda de imóvel celebrados com instituições financeiras. A Lei nº 8.004/90 expressamente permitia a transferência do contrato, desde que “em ato concomitante à transferência do financiamento respectivo, com a interveniência obrigatória da instituição financiadora, mediante a assunção, pelo novo mutuário, do saldo devedor contábil da operação” (art. 1º, parágrafo único). A Lei nº 8.692/93, por seu turno, previa que “Na transferência a terceiros de direitos e obrigações decorrentes dos contratos de que trata esta lei, será assegurada ao novo mutuário a manutenção das condições de prazo, juros e plano de reajustamento, aproveitando-lhes as prestações anteriormente pagas” (art. 20). Todavia, na prática, a transferência do financiamento, nas bases de reajustamento adotadas pelo SFH, inviabilizava essa operação, uma vez que, na maioria dos casos, o saldo devedor existente junto à instituição financeira contabilizava valores que extrapolavam o valor real ou de mercado do imóvel. Por outro lado, tantas eram as exigências para aprovação do cadastro do cessionário ou interessado na transferência que somente, em raras situações, a instituição financeira concordava com a realização da operação.
A principal inconveniência do contrato de gaveta para o cessionário e possuidor do imóvel, que assume a obrigação de pagar as parcelas pendentes do financiamento, é que este não tem legitimidade para discutir ou questionar, perante a instituição financeira, qualquer problema decorrente de reajuste indevido da prestação ou do saldo devedor, pois o contrato permanece, para todos os efeitos legais, em nome do mutuário original. E mesmo após o pagamento de todas as prestações, o cessionário enfrentará dificuldades visando a liberação da hipoteca e a conseqüente transferência do imóvel para o seu nome, uma vez que a instituição financeira somente reconhecerá o mutuário original como titular do direito de propriedade.
Pergunta: Se o terceiro não cumpre um contrato que figura a tranferencia do cargo hipotecario a cabo de uma determinada data e, alem do mais, atrasa parcelas a ponto de a propriedade correr perigo de ir a leilão; é possivel o titular da hipoteca recuperar a casa?
ResponderExcluirSergio Ferreira Moura
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