Existe e ainda persiste, no direito brasileiro, uma flagrante contradição que diz respeito ao fato gerador ou, em linguagem comum, ao momento em que o contribuinte deve pagar ou recolher, aos cofres públicos, o imposto sobre a transmissão de bens imóveis, por ato entre vivos (ITBI) ou em virtude de causa morte (ICD).
No âmbito do direito formal, as normas da legislação tributária das Prefeituras Municipais (arrecadadoras do ITBI), e dos Estados, (com competência para o recolhimento do ICD), definem como ocorrido o fato gerador ou a hipótese de incidência tributária o momento da celebração do respectivo contrato particular ou da escritura pública de alienação do imóvel. Assim, por exemplo, para a legislação tributária do Município do Recife, o imposto de transmissão inter vivos (ITBI) deve ser recolhido, à alíquota de 2 % sobre o valor da avaliação fiscal, até o ato da lavratura do contrato ou da escritura de transferência imobiliária (Lei Municipal 15.563/91, art. 43).
O vigente Código Civil de 1916, considerado, no nosso ordenamento jurídico, como norma superior especial equiparada às leis complementares à Constituição, enuncia, de modo objetivo, que a transmissão e a conseqüente aquisição da propriedade imobiliária somente se perfaz quando da transcrição do respectivo título aquisitivo no cartório do registro de imóveis competente (Código Civil, art. 530, I; art. 676).
A legislação tributária dos Estados e Municípios, contrariando a previsão do Código Civil, exige o recolhimento do imposto de transmissão previamente ao ato de registro do título aquisitivo correspondente no cartório de imóveis, sujeitando, assim, tal obrigação tributária, ao ato prévio da contratação, seja este por escritura pública, seja por instrumento particular. Tal contradição conceitual é de suma significação para a situação concreta dos contribuintes proprietários de imóveis, vez que estes estão sendo obrigados a recolher o imposto de transmissão sobre bens imóveis ainda antes da ocorrência do seu fato gerador legal.
Há quase 10 anos, desde 1992, o Superior Tribunal de Justiça – STJ, segunda maior instância da jurisprudência nacional, vem entendendo e decidindo, em consonância com a correta interpretação do Código Civil e do Código Tributário Nacional (Lei Federal 5.172/66, art. 109), que o imposto de transmissão de bens imóveis somente tem o seu fato gerador no momento do registro ou da transcrição do respectivo título no cartório de imóveis (REsp 12.546/RJ; REsp 253.364/DF).
As decisões unânimes e reiteradas do STJ concluem que a exigibilidade do recolhimento do imposto de transmissão no ato da celebração dos instrumentos particulares ou de escrituras públicas de transferência da propriedade ou de direitos reais, contraria o ordenamento jurídico e os princípios do sistema de direito positivo. E assim contestaria e discutiria essa contradição, com toda certeza, o nosso mestre recentemente falecido, ora elevado, em sublime homenagem, à categoria superior dentre os imortais das letras jurídicas, o douto e inigualável Prof. Dr. Lourival Vilanova.
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